Esses Ingleses 3: Garbo estético enriquece “Ligações Perigosas”

12 nov

Afonso Gentil, especial para o Aplauso Brasil (michel@aplausobrasil.com)

Maria Fernanda Cândido e Marat Descart em "Ligações Perigosas"

Para provar que nem tudo está perdido nesta cidade em tempos de vale-tudo sob o pretexto de “experimentação”, no palco ou fora dele (haja rua!), os deuses do Teatro nos presentearam em um só ano, este, com uma dezena de ótimos espetáculos de textos de autores ingleses contemporâneos.

Já nos ocupamos, cada qual a seu tempo, das felizes encenações de Francisco Medeiros em “O Amante”, de Harold Pinter e de Mika Lins  emDueto Para Um, de Tom Kempinski, dois mestres da arte do diálogo no palco.

Cometeríamos injustiça se não fizessemos, aqui, mesmo rapidamente, menção ao cartaz do Teatro Jaraguá, Os Penetras, de Mike Leigh, um esperto espelho de desencontros familiares e profissionais da classe média londrina na era Thatcher (1980).

Desempenhos seguros de um quinteto de atores afinados entre si, garantem a adesão da platéia a um tipo de comicidade não tão costumeiro.

A fulminante revelação de Mauro Baptista Vedia para a direção teatral, desde o recente sucesso A Festa de Abigaiu, sela aqui, em definitivo o destino do majestosamente tenso Ligações Perigosas, como se pode ver a seguir.

Mas, antes, uma dica para quem está curioso para detalhes sobre a “invasão inglesa”, como chamou Edgar Olimpio de Souza, em matéria de poucas palavras e muito conteúdo no seu site Revista Stravaganza.

TIME DE TALENTOSOS VENCEDORES

Marat Descartes e Sabrina Greve em "Relações Perigosas"

Em Ligações Perigosas o coroado desfile de talentos começa muito justamente com o seu autor, o inglês Christopher Hampton,  de carreira com bastante êxito, com alguns Oscars na bagagem. Aqui, Hampton foi buscar sua torrente de maldades, alimentada fria e cinicamente por dois nobres em vaidoso conflito amoroso, no romance epistolar setecentista homônimo, de Choderlos de Laclos, que virou um clássico do gênero melodrama.

Depois, por ordem de excelência, vem a produção primorosa de LG Tubaldini Jr., um nome a não mais esquecer. Ex-advogado bem sucedido, deixou a profissão, em 2001, para investir em cultura. Dono de um mega-sucesso (Toc Toc) e outros próximos disso, não deve ter medido gastos para atingir o garboso patamar estético logrado em todos os pormenores da montagem.

Porém, o brilho da encenação correria o risco de ser só aparente não fosse a atuação do diretor Mauro Baptista Vedia, que nos tem parecido, por seus seguidos trabalhos, um verdadeiro amante do teatro, “ave rara” num universo de falsos brilhantes.

Vedia esparrama seu respeitoso e empolgado amor ao teatro por todos os setores, evidenciado em muito no trabalho do elenco, extraindo da sub-estimada, embora famosa e talentosa, Maria Fernanda Cândido, toda a humanidade de mulher traída querendo provar sua superioridade ante o desafeto, para além da clicheria vilanesca costumeira.

O diretor também maneirou o exuberante Marat Descartes (o Visconde, irresponsável e vaidoso, antagonista da Duquesa de Maria Fernanda Cândido), com reações sempre cabíveis, garantindo a esse ótimo ator, em crescente e justificada ascensão, mais um marcante trabalho.

Sabrina Greve, que você já aplaudiu em espetáculos do CPT do Antunes Filho, faz a vitima de uma diabólica aposta. Em atuação coesa, tem momentos de intensa e bem dosada dramaticidade.

A jovem e bela Laura Neiva, possui todos os requisitos do papel da inocente Cécile, que termina não tão inocente assim.

Clara Carvalho (também competente tradutora de sucessos em cartaz) e Chris Couto remetem-nos, sem esforço aparente, à pulsação dos nobres da época.

Eficientes também, Camila Czserkes, Ivan Capúa, Ricardo Monastero, Júlio Machado e toda a “criadagem” de discreta e bem cronometrada contraregragem.

Mérito, repetimos, de um diretor detalhista e criativo.

Com o seu alto nível profissional e artístico, Ligações Perigosas pode não ganhar prêmios de júris preconceituosos (“enturmados”), mas ganha, a nosso ver, status de igualdade com o que de melhor gira em palcos nobres alhures.

SERVIÇO:

Ligações Perigosas / Teatro FAAP /Rua Alagoas, 903, Higienópolis / fone 3662-7232 /  504 lugares / 6ª. 2lh30, Sab. 21h, dom. 18h /Ingressos R$ 70,00 (6ª. e domingo) e R$ 80,00 (sábado) /120 minutos / 14 anos /  até 16-12.

3 Respostas to “Esses Ingleses 3: Garbo estético enriquece “Ligações Perigosas””

  1. Edgar Olimpio de Souza 13 de novembro de 2010 às 1:39 AM #

    Oi Michel,

    Quero agradecê-lo por ter dado o link da revista Stravaganza, que eu criei e edito com muito suor e dedicação, da mesma forma que você faz com o Aplauso Brasil, referência e consulta obrigatória para quem gosta de artes cênicas.
    Um grande abraço, do amigo e colega de crítica Edgar

    • michelfernandes 14 de novembro de 2010 às 3:51 AM #

      muito obrigado querido! recomendo a todos sua revista eletrônica. abraços, michel

  2. Clara Carvalho 14 de novembro de 2010 às 3:53 PM #

    Afonso, querido,

    Foi uma alegria para todos nós ler sua critica sobre o espetáculo e de saber que você gostou. É um espetáculo criado com entusiasmo por todos nós e que continua em processo, sendo aprimorado. Um abraço carinhoso. Clara

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